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Cidade que respira cores e formas

 

A maneira pelo qual o paulistano enxerga o grafite

GIOVANA MENEGUIN

Levantar da cama cedo, sair de casa e misturar-se ao intenso fluxo de pessoas nas ruas de São Paulo. É assim que começa a rotina da maioria dos paulistanos. Por conta do vai e vem diário, muitos detalhes da cidade passam despercebidos pelas pessoas; detalhes que perdem para o estresse e correria constante dos moradores da cidade que não para.

A Avenida Paulista reflete muito bem a desatenção da maioria dos paulistanos para com a arte de rua. Em uma segunda-feira, às 13h00, a Paulista está movimentada. Homens e mulheres andam para todos os lados, uns a lazer e outros a trabalho. Entretanto, poucas são as pessoas que se deixam parar e observar o casarão Franco de Mello. A única construção residencial da Paulista, o palacete foi erguido em 1905, e, hoje, é decorado com diversos desenhos, que estão em constante metamorfose.

A estudante de Medicina veterinária, Bianca Turella, 21, é uma das poucas pessoas que param para fotografar o casarão. Ela concorda que os desenhos proporcionam vida à uma cidade toda cinza. A estudante conclui que “os grafites também representam uma forma de reflexão em meio ao caos”.

O grafite é uma das manifestações artísticas mais marcantes da capital paulista nos dias de hoje. Importada de Nova Iorque, onde nasceu de fato e sofreu influência de movimentos como o Hip Hop, a  técnica de criar desenhos nas paredes chegou em São Paulo entre os anos 1970 e 1980, durante o fim da ditadura militar como forma de expressão. Apesar de ser frequentemente confundido com pichação e vandalismo, atos de escrever em paredes e muros, o grafite se consagrou como uma forma de arte que visa interferir na cidade, por meio de pinturas e desenhos bem trabalhados, e, assim, dialogar com questões políticas e sociais.

Todavia, apesar de toda a história por trás das pinturas nos muros, o paulistano quase não se dá conta da riqueza artística que possui a sua volta. Quando indagadas sobre a arte de rua, as pessoas mostram-se pensativas. Refletem por alguns segundos e vagamente respondem “é bonito”. Ao serem questionadas mais a fundo, frente à insistência, as pessoas pensam um pouco mais e, sem intenção, acabam por soltar frases como “olha, eu nunca reparei nisso”, como é o caso da professora aposentada Marlene Marioni, 68, indagada durante o seu passeio pela Rua da Glória, no bairro da Liberdade. Em meio à risos, ela completa dizendo que “o grafite é uma arte de expressão” e, por isso, “é importante e enfeita a cidade”.

Esse é o caso do painel de 5,4 quilômetros de extensão na Avenida 23 de Maio, que é composto por obras de 200 artistas. Inaugurado em 2015, o painel representa o maior corredor de arte urbana da América Latina. A via, antes cinza e monótona, ganhou um tom de alegria e passou a ser um ponto de interesse da cidade, fazendo parte, inclusive, de rotas turísticas.

O estudante Pedro Nogueira, 20, fotografa os diversos grafites na Rua Gonçalo Afonso, que compõe o famoso Beco do Batman, na Vila Madalena; o bairro boêmio de São Paulo ganhou fama pelos grafites na década de 1980, quando estudantes de artes plásticas passaram a cobrir os muros cinzas com desenhos. Para Pedro, a arte urbana tem diversos significados. “ É uma maneira de criticar a sociedade, de ser rebelde e expressar as condições precárias das periferias, por exemplo”, ele matuta enquanto troca olhares com seu grupo de amigos. O estudante comenta que “os grafites simbolizam a poesia das ruas”.

A arte sempre esteve presente na vida da publicitária Gisele Bellucci, 39. Filha de artista, ela leva a arte em sua vida e, por isso, valoriza qualquer forma de expressão artística. Ao percorrer as ruas do bairro de Santana, ela admira os pequenos detalhes que estão à mostra, pois “representam um alívio em meio aos prédios e ao concreto”. Porém, o grafite chama sua atenção por um simples motivo: aproxima as pessoas da arte. Ela explica que os grafites espalhados por São Paulo são uma forma fácil de “levar um pouquinho de arte e cor para todos”, visto que os desenhos estão no espaço público e podem ser contemplados de forma gratuita. Gisele também comenta que, a vantagem das pinturas ao ar livre, é que “você não precisa ir muito longe para ver, às vezes está ao lado de sua casa, é totalmente acessível”.

A arte urbana está presente na vida do paulistano, querendo ele ou não. São Paulo é um museu à céu aberto, frase clichê, mas que define muito bem a cidade, que é, cada vez mais, totalmente ressignificada pela arte e suas formas plurais de manifestação. Há formatos e cores por todos os lados, seja na badalada Avenida Paulista, nas ruelas do centro, nas estações de metrô, nos postes de luz ou nas ruas calmas de bairro. A arte urbana não oferece descanso para o paulistano.

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A reportagem “Cidade que respira cores e formas” estabelece diálogos com os seguintes trabalhos: “Poética diversa”, de Camila Milani, sobre a ressignificação urbana e da identidade paulistana por meio da arte e do lazer; “Um Olimpo reinventado”, de André Fonseca, o vídeo trata da forma pela qual a Avenida Paulista é ressignificada pelos moradores de São Paulo. 

Artes & Lazer

Poética Diversa

 

A identidade da cidade camaleão

CAMILA MILANI

O homem estava de terno e gravata, apesar dos quase 30 graus que fazia naquela tarde. Ele não se importou com o desconforto causado por sua roupa ou com o calor que o fazia suar por baixo dela. O executivo quis ir ao parque do Ibirapuera com seus colegas para almoçar e depois dar uma volta de bicicleta.

 

Era engraçado observar o homem de terno e gravata equilibrando-se na bicicleta alugada. Ele ria ao perceber que era observado com estranhamento pelas demais pessoas no parque. Aquele homem em cima daquela bicicleta, formava uma imagem completamente fora de contexto e, justamente por isso, o executivo parecia se divertir.

 

O contraste do maior e mais popular parque paulistano não se dava apenas pela grama que grudava na calça social daquele homem. Dava-se por ser o início da tarde de uma segunda-feira, pelo número de pessoas de calça jeans jogando Pokémon Go e pelas motocicletas feitas com resto de computadores expostas na margem do lago, como se estivessem em um museu.

São Paulo é uma cidade que foge do óbvio, onde as artes vão além de pinturas, esculturas e museus, e onde a definição de lazer pode ter inúmeros significados. O paulistano reinventa a cidade e reinventa a si mesmo todos os dias, seja na gastronomia, no praticar esportes, no festejar ou na forma de afirmar sua própria identidade. Mas afinal, o que é ser paulistano?

"Ser paulistano é não ter um rosto, você pode ser o que quiser. É poder estar em vários lugares em um só", disse a estudante de enfermagem Stephane Covillo, enquanto voltava para casa, numa noite de quinta-feira. Ela falava, com brilho nos olhos, como São Paulo parecia ser uma cidade livre de estereótipos e de como ela abriga os mais variados tipos de pessoas e lugares. "Ela é de todo mundo. É impossível não amar São Paulo".

A pluralidade é uma das principais características paulistanas. Cada pedaço da cidade tem sua própria expressão cultural e suas próprias peculiaridades. O bairro da Liberdade, por exemplo, tem sua arquitetura, lojas e eventos com influências asiáticas, por causa da imigração japonesa que aconteceu no início do século XX. O mesmo acontece com o bairro do Bixiga, fundado por imigrantes italianos, e que abriga as mais tradicionais festas e cantinas de São Paulo.

 

Além deste traço cosmopolita que é tão singular e intrínseco à cidade, São Paulo também abriga as mais variadas subculturas. Góticos, rastafaris, hippies, rappers, punks, cosplayers... Cada uma destas tribos possui seu polo de manifestação, modificando assim a identidade cultural de um determinado local e transformando sua aparência e expressão. 

No bairro da Mooca, uma estação de trem abandonada tornou-se exemplo desta ressignificação urbana de arte e lazer. Os trilhos enferrujados e os vagões históricos e obsoletos destinados à erosão, transformaram-se em um espaço cultural.  À noite, a antiga estação converte-se numa casa noturna, onde a pista de dança encontra-se embaixo de um viaduto. "O mais legal do espaço é o fato de ele te transportar para uma outra época, como se você voltasse no tempo. O lugar tinha tudo para ser um local perigoso e abandonado, mas se transformou num meio de manifestação cultural", disse a arquiteta Aline Pereira, que passou a frequentar o local há um ano.

São Paulo é cidade camaleão, onde não há definição ou delimitação do que é arte e lazer. Seja no fotografar, pintar, festejar ou poetizar, os bairros, avenidas, ruas, becos e até mesmo o transporte público se transformam, e se metamorfoseiam em espaços para a manifestação cultural. Em meio aos passos apressados e ao stress do cotidiano, os olhos paulistanos estranham e  são incompreensíveis às cores e poesias expressas nos muros e no asfalto da cidade.

 

A avenida Paulista - endereço afamado e lembrado por ser o centro financeiro do Brasil - transforma-se em tela para os pintores, palco para os músicos e inspiração para os demais artistas. O rapaz peruano de vinte e poucos anos rabiscando a calçada da estação Trianon-MASP virava atração e fazia dezenas de pessoas aglomerarem-se ao seu redor.  Ninguém acreditava que, em meio ao sol do meio-dia, sentado na calçada, aquele jovem conseguia fazer o retrato perfeito de uma mulher, usando apenas giz escolar e pós coloridos.

 

Natural de El Callao e morador de Los Olivos, Cristhian Ventura abriu um largo sorriso e arriscou um "obrigado", quando elogiado por sua arte. Ele explicava para as pessoas à sua volta sobre sua trajetória até chegar em solo paulistano. "Passei pela Bolívia e estou há cinco dias em São Paulo, pintando", disse o moço latino.

 

São Paulo tem essa identidade indefinida, indeterminada, mas ao mesmo tempo, plural e cosmopolita. São muitas personalidades, histórias e culturas que formam uma única e ímpar expressão. Esta identidade está na pintura da gueixa surrealista no muro da Paulista, está na pista de dança embaixo do viaduto da Mooca, no Pelé que beija David Bowie e no pernambucano que trabalha no restaurante coreano na Liberdade.

 

E se, segundo um lambe da Avenida Paulista "há um mundo de valores inteiro que deve ser subvertido através da arte", São Paulo com certeza é um pedaço deste mundo, seja através das expressões culturais de seus habitantes ou daqueles que vêm se inspirar na cidade. E talvez a melhor definição do que é ser paulistano esteja escrita na calçada do Parque Mario Covas: "Busca incansável da poesia".

 

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A reportagem “Poética Diversa” estabelece diálogos com os seguintes trabalhos: “Cidade que respira cores e formas”, de Giovana Meneguin, sobre como o paulistano enxerga o grafite em São Paulo; “Um Olimpo reinventado”, de André Fonseca, o vídeo trata da forma pela qual a Avenida Paulista é ressignificada pelos moradores de São Paulo. 

A arte liberta

PEDRO BASSI

“A Arte liberta”, como já havia dito o rapper Criolo em uma de suas composições. E realmente liberta. Mas, liberta o que? Pergunte a si mesmo. Qual é o sentimento de liberdade?! Será que liberta a sociedade de algo que os prendem? Ou será que é capaz de despertar e libertar o sentimento de amor pela cultura nas pessoas? É, talvez sim, mas talvez só arriscando para saber. Vamos em frente!

Arte é cultura, transmitida aqui, acrescentada lá, conforme sua enorme diversidade lhe possibilita agir de acordo com a série de aspectos que a envolvem, mas o fato é que representa uma identidade. De um ser, de um local, talvez até de um ser atuando naquele local. Essa sim é indispensável. A forma de atuação e representação de ambos desenvolvida seguida da proposta apresentada.

Para ter noção de tamanha diversidade cultural, pegamos um exemplo recente. Em função da comemoração da Independência Mexicana, em que é celebrada do dia 15 para o dia 16 de Setembro, o grupo artístico musical Mariachi Real da América, formado por 35 integrantes, lançou seu projeto de oferecer concertos e cursos musicais pelo Brasil, nas cidades de Brasilia, Rio de Janeiro e São Paulo, respectivamente.

A apresentação na cidade de São Paulo, foi sediada no bosque cultural, ao ar livre, para estudantes e funcionários do Mackenzie na própria Universidade. Sim, cultura musical também pode ser reproduzida ali, e que no caso foi uma exibição de uma parte da cultura tradicional e histórica do país. Trouxeram seu manifesto, transmitindo sua mensagem cordial a respeito da tal liberdade, reconhecida pela independência Mexicana.

O grupo Mariachi envolve os espectadores rapidamente com seus instrumentos musicais e belíssimas vozes de alguns integrantes do grupo, pois nem todos cantam. A comemoração toma conta do espaço naquele momento, tornando-o em um local festivo e atraente, e com certeza alegrando o dia de cada um que ali filmavam, cantavam, e que até dançaram de maneira surpreendente. Nem todos os elementos desta ocasião puderam ser inclusos no projeto, como por exemplo as pistolas carregadas pelos integrantes do grupo, que faz parte do ritual, porém não foram utilizadas por questões de segurança. Sem contar na presença inesperada do famoso Sombrero, chapéu de origem Mexicana.

Aconteceu algo parecido na semana seguinte. No vão do Museu de Arte de São Paulo, o jovem Vinicius Davi, 18 anos, apresenta sua habilidade com o violino, curiosamente o mesmo instrumento mais usado pelos Mariachis. Davi apresenta-se com um auxílio de uma caixa de som com hits atualizados comandados por seu pequeno Smartphone. A capa do violino estendida ao seu lado no chão, serve de depósito para moedas singelas e notas com valor sentimental.

 A ressignificação do espaço nem sempre é alegre como esta tarde, onde Davi foi surpreendido por um grupo escolar que descia as escadas do museu já em ritmo de dança pelo auto e bom som de suas ferramentas de trabalho. O artista alega passar por momentos frustrantes assim como o transito elevado na avenida. “Tem gente que passa aqui e parecem estar de olhos fechados, minha caixa de som já foi ao chão, meu violino já foi chutado, só falta eu ser atropelado por estes de amor cego.”

A integração e interação do público com a Arte deve ser feita de um jeito ou de outro, influenciada pelos movimentos culturais e sociais, a sociedade deve permitir e ajudar a desenvolver maior nível de conhecimento, a importância é enorme. E lembre-se, liberte-se!

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